Barça e Bayern: os donos da bola na Champions League
A 5ª rodada da Champions League 2015/16 chegou ao fim hoje. Um dado sugestivo do rendimento das equipes até aqui aponta para a constatação gritante de que Barcelona e Bayern de Munique são, de longe, aquelas que conseguem manter a mais alta posse de bola em suas partidas. Ambas detém, em média, 67% do tempo a bola a cada jogo, segundo dados estatísticos oficiais da UEFA.
O terceiro clube no fundamento é o Manchester United, com 61%, seguido do PSG, com 60%, como quarto. Surpreendentemente, o Zenit, único clube com 100% de aproveitamento na competição e com o terceiro ataque mais positivo (12 gols), até aqui, põe em prática outro tipo de futebol e por isto chega à média de apenas 42% neste fundamento.
Vale refletir também sobre o fato de que o Real Madrid, com um dos elencos mais caros do mundo e composto de vários meio campistas de alto nível, com o mesmo número de vitórias (4) que o Barcelona e o Bayern, aparece com apenas 51% de posse de bola, evidenciando provavelmente um sistema tático que privilegia os contra ataques e as ligações diretas como jogadas de transição. Com isto 16 times da competição tem alcançado uma média de controle do jogo superior à equipe do poderoso tridente BBC.
A INSPIRAÇÃO HOLANDESA
Os dados apenas comprovam que as 3 equipes que procuram controlar o jogo através da posse da bola bebem na fonte da concepção holandesa de futebol, da ideia de que um time deve controlar o jogo, dominar o adversário, se valer do passe como um instrumento fundamental de subjugar o time contrário.
É verdade que há particularidades na maneira com que cada um deles aplica o conceito, mas é inegável que tudo nasce no Barcelona com Rinus Michels, passa por Johan Cruyff, a seguir por Louis Van Gaal e Frank Rijkaard e é aperfeiçoado e modernizado por Pep Guardiola, que jogou tanto sob a direção de Cruyff quanto sob a de Van Gaal e que não se cansa de reconhecer o quanto neles se inspira atualmente.
Luís Enrique tem méritos próprios inegáveis na definição tática posta em prática pelo atual elenco barcelonista que conquistou a tríplice coroa na temporada passada e por manter o alto nível de performance com a liderança na La Liga e em seu grupo na Champions League que estão em disputa. Mas não podemos esquecer que, como jogador do Barcelona, ele atuou sob o comando de Van Gaal (1997 a 2000 e 2002/03) e Rijkaard (2003/04).
Ele mexe menos na escalação da equipe a cada partida, não explora tanto a versatilidade de cada jogador como faz Guardiola, assim como não modifica tanto suas opções táticas em função das virtudes e fragilidades do adversário. Mas, a seu modo, o Barcelona também domina seus adversários, impõe seu ritmo, administra a bola da maneira que quer, ditando o ritmo e a intensidade do jogo.
Já o Bayern de Munique é a própria concretização da concepção de futebol de Pep Guardiola, talvez o mais criativo, inovador e bem sucedido técnico de futebol contemporâneo.
Muitos confundem o conceito de controlar o jogo através da posse da bola com o toque de bola inconsequente e sem objetivo que costuma ser identificado como o “tiquitaca”. Pois, é o próprio Guardiola que faz questão de diferenciar os dois estilos, em depoimento publicado no livro “Guardiola Confidencial, de Martí Perarnau:
– Eu odeio o tiquetaca. Odeio! Isso é passar a bola por passar, sem qualquer propósito. E não serve para nada. Não acreditem no que dizem por aí. O Barça não tinha nada de tiquetaca. Isso é invenção, não acreditem! … precisamos passar a bola, sim, mas com intenção, com propósito. Passá-la para sobrecarregar um dos lados para atrair e resolver no canto oposto. Nosso jogo é esse e não o tiquetaca”.
Pelo menos para o técnico do Bayern de Munique sua visão de posse de bola pode ser sintetizado nos seguinte pontos indicados por Perarnau em seu livro:
- a movimentação da bola em “U” é quando o movimento de saída de bola é repetitivo e estéril. A bola circula de um lado para o outro de maneira inócua. A bola circula de um lado para o outro, de pé em pé, sem qualquer propósito. É como um cozido sem sal… Não temos nenhum interesse neste tipo de posse. É puro desperdício. O que precisamos é que nosso volante e nossos zagueiros saiam com agressividade e rompam as linhas do rival para nos levar bem à frente.
- o avanço em conjunto. trata-se de uma viagem em grupo. O início da jogada é essencial para a evolução posterior. Portanto é preciso sair de trás de forma limpa, através de uma sucessão de passes que permita aos jogadores evoluir do modo desejado.
- a bola que ordena. A sucessão de passes com propósito equilibra a equipe. Leva-a às posições adequadas e a agrupa, permitindo o ataque ordenado e a recuperação da bola sem grande esforço em caso da perda.
- a superioridade no meio de campo. A essência do jogo é sempre ter a superioridade, numérica e posicional, sobre o adversário. É alcançá-la na zona central do campo. Assegurar a superioridade de maneira constante que lhe garanta o domínio dos jogos.
- tocar a bola até o time se agrupar. Chegar a três quartos do campo através da sucessão de passes. Subir bastante a linha defensiva e ter sempre um homem a mais no meio de campo, seja como for. Não há sistema tático fixo, nem equipe titular indiscutível. Isto muda jogo a jogo. A análise do rival é cada vez mais importante.
O futebol moderno contempla mais de uma maneira eficiente e consistente de se buscar a vitória, mas a ideia de que controlar a bola e usá-la com inteligência e rapidez está por trás das equipes que mais tem encantado o mundo nos últimos tempos.
O gráfico a seguir, atualizado já incluindo a rodada concluída hoje, aponta a média de posse de bola dos 32 clubes envolvidos na disputa de Grupos da atual Champions League. Ele deve ser analisado e servir de inspiração para quem pensa o futebol.